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M E N S A G E M  Nº  56/2022

Excelentíssimo Senhor

Vereador ROBERTO GOMES FAÇANHA

Presidente da Câmara Municipal de Corumbá

Tenho a honra de dirigir-me a Vossa Excelência e, por seu intermédio, aos demais Excelentíssimos Senhores Vereadores para comunicar, na forma autorizada pelo art. 65, §1º da Lei Orgânica do Município, que optei pelo VETO TOTAL ao Projeto de Lei nº. 065/2022, o qual “Autoriza o poder Executivo Municipal a adquirir e doar óculos de grau às pessoas de baixa renda, e dá outras providências”, pelos fatos e fundamentos que passo a expor.

RAZÕES DO VETO

I - DO RELATÓRIO

O projeto de lei possui como cerne central instituir no município de Corumbá, Lei Municipal autorizando o Poder Executivo a adquirir e doar óculos de grau às pessoas de baixa renda, visando a promoção de qualidade de vida à população que possuem dificuldade em adquirir por recurso próprio o referido bem.

II - DA ANÁLISE DA MATÉRIA

Em que pese a louvável iniciativa do Vereador autor do Projeto em pauta, apresento VETO TOTAL ao referido Projeto de Lei, em razão do mesmo sofrer de vício de iniciativa, sendo, portanto, inconstitucional pelas razões a seguir expostas:

Os arts. 4º e 5º do Projeto de Lei preveem que a respectiva ação deverá ser desempenhada pelo Município, sendo certo que para tanto, o Poder Executivo deverá destinar orçamento para desenvolvimento e cumprimento dos dispositivos mencionados

Ocorre que o Projeto de Lei em comento não indicou a fonte de financiamento para suportar referida despesa, sendo que o Município não previu no orçamento do corrente ano a despesa para a operacionalização do programa.

Sobre o tema, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº. 101, de 04 de maio de 2000), menciona que:

Art. 5º O projeto de lei orçamentária anual, elaborado de forma compatível com o plano plurianual, com a lei de diretrizes orçamentárias e com as normas desta Lei Complementar:

II - será acompanhado do documento a que se refere o http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm, bem como das medidas de compensação a renúncias de receita e ao aumento de despesas obrigatórias de caráter continuado;

Neste sentido, em que pese a louvável intenção do Parlamento municipal em promover a qualidade de vida, garantindo condições mínimas de saúde aos munícipes, a inconstitucionalidade dos dispositivos do Projeto fica evidente a partir do art. 4º, que estabelece obrigações para órgãos vinculados ao Poder Executivo. O dispositivo traz um conjunto de ações e atribuições que impõe, inclusive, reserva de orçamento para tanto.

Assim sendo, para o devido atendimento às determinações citadas nos artigos 4º e 5º, o Projeto de Lei ora apresentado deveria constar a estimativa do impacto orçamentário-financeiro a ser causado pela implementação de tal medida.

Ademais, em consulta com a Secretaria Municipal de Saúde, esta informou que deu início ao programa municipal de visão legal em atendimento a Lei Ordinária nº 2.173, de 10 de janeiro de 2011, que visa e regulamenta a distribuição de óculos de grau de forma gratuita para os alunos da REME, bem como para pessoas idosas no âmbito do município de Corumbá/MS.

Neste espeque, trazendo ao presente projeto, observa-se que para a efetiva distribuição de óculos de grau para pessoas de baixa renda, será necessário a estimativa da quantidade a ser entregue em conjunto aos beneficiários previstos na Lei supramencionada, considerando a disponibilidade financeira para tanto.

Noutro giro, através do Projeto de Lei em comento, a Câmara cria obrigações à Administração. Embora meritório o incentivo do Legislativo local, a iniciativa não tem como prosperar na ordem constitucional vigente, uma vez que a norma diz respeito a atos inerentes à função do poder executivo.

Com efeito, a forma de prestação de serviços públicos é matéria de preponderante interesse do Poder Executivo, já que é a esse Poder que cabe a responsabilidade, perante a sociedade, pela eficiência da Administração.

Sendo assim, a iniciativa do processo legislativo para criação de políticas públicas, funcionamento de serviços municipais e atribuições às secretarias municipais é privativa do Poder Executivo, pois, como assinala Manoel Gonçalves Ferreira Filho “o aspecto fundamental da iniciativa reservada está em resguardar a seu titular a decisão de propor direito novo em matérias confiadas à sua especial atenção, ou de seu interesse preponderante” (Do Processo Legislativo, São Paulo, Saraiva, p. 204).

Por esse motivo, a Constituição Estadual, no inciso IX, do art. 89, conferiu ao Governador do Estado a iniciativa privativa das leis que disponham sobre as atribuições da administração pública e, consequentemente, sobre os serviços públicos por ela prestados, direta ou indiretamente. Trata-se de questão relativa ao processo legislativo, cujos princípios são de observância obrigatória pelos Municípios, em face do artigo 17, da Constituição do Estado, tal como tem decidido o Supremo Tribunal Federal:

“O modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Constituição da República - inclusive no que se refere às hipóteses de iniciativa do processo de formação das leis - impõe-se, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à incondicional observância dos Estados-Membros. Precedentes: RTJ 146/388 - RTJ 150/482” (ADIn nº 1434-0, medida liminar, relator Ministro Celso de Mello, DJU nº 227, p. 45684).

Se a regra é impositiva para os Estados-membros, é induvidoso que também o é para os Municípios.

As normas de fixação de competência para a iniciativa do processo legislativo derivam do princípio da separação dos poderes, que nada mais é que o mecanismo jurídico que serve à organização do Estado, definindo órgãos, estabelecendo competências e marcando as relações recíprocas entre esses mesmos órgãos (Manoel Gonçalves Ferreira Filho, op. cit., pp. 111-112). Se essas normas não são atendidas, como no caso em exame, fica patente a inconstitucionalidade, em face de vício de iniciativa.

Neste sentido, ensinou Hely Lopes Meirelles que se “a Câmara, desatendendo à privatividade do Executivo para esses projetos, votar e aprovar leis sobre tais matérias, caberá ao Prefeito vetá-las, por inconstitucionais. Sancionadas e promulgadas que sejam, nem por isso se nos afigura que convalesçam de vício inicial, porque o Executivo não pode renunciar prerrogativas institucionais inerentes às suas funções, como não pode delegá-las aquiescer em que o Legislativo as exerça” (Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 7ª ed., pp. 544-545).

Assim sendo, se a Constituição atribuiu ao Poder Executivo a responsabilidade pela prestação dos serviços públicos, é evidente que, pela teoria dos poderes implícitos, a ele deve caber a iniciativa das leis que tratem sobre a matéria. Essa teoria dos poderes implícitos - implied powers - surgiu no voto de Marshall, proferido no leading case McCulloch versus Maryland, de 1819, afirmando que, quando o Governo recebe poderes no sentido de cumprir certas finalidades estatais, dispõe também, implicitamente, dos meios necessários de execução. “Se o governante tem atribuições para praticar certos atos, cabe-lhe igualmente exercer aquelas que possibilitem seu exercício” (Caio Mário da Silva Pereira, em “Pareceres do Consultor-Geral da República”, v. 68, pp. 99-100).

III. DISPOSITIVO FINAL

Diante dos apontamentos acima alinhados, o Projeto de Lei não pode ser sancionado, vez que, em assim sendo, estar-se-á legislando sob a égide da ilegalidade, em razão de padecer de vício de inconstitucionalidade formal, razão pela qual apresento veto integral e total ao Projeto de Lei em questão, rogando aos Senhores Vereadores sua manutenção pelas razões ora expostas.

PREFEITURA MUNICIPAL DE CORUMBÁ,

EM 14 DE OUTUBRO DE 2022

MARCELO AGUILAR IUNES

PREFEITO MUNICIPAL