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M E N S A G E M  Nº  51/2022

Excelentíssimo Senhor

Vereador ROBERTO GOMES FAÇANHA

Presidente da Câmara Municipal de Corumbá

Tenho a honra de dirigir-me a Vossa Excelência e, por seu intermédio, aos demais Excelentíssimos Senhores Vereadores para comunicar, na forma autorizada pelo art. 65, §1º da Lei Orgânica do Município, que optei pelo VETO TOTAL ao Projeto de Lei nº. 062/2022, o qual “Institui no Município de Corumbá o Programa Pequenos Atletas”, pelos fatos e fundamentos que passo a expor.

RAZÕES DO VETO

I-     RELATÓRIO

O respectivo Projeto de Lei pretende instituir o Programa Pequenos Atletas, com o objetivo de reconhecer crianças e adolescentes que tenham habilidades esportivas no âmbito do município de Corumbá.

O programa consiste, resumidamente, na reunião de ações e parcerias entre administração pública municipal, clubes esportivos e órgãos privados, tendo por objetivo possibilitar aos alunos da rede municipal de ensino demonstrar suas habilidades e, assim, conseguir eventuais patrocínios e participações em campeonatos e competições.

II - DA ANÁLISE DA MATÉRIA

Inicialmente, cumpre-nos consignar que que a discussão relativa a vício de iniciativa no processo legislativo é de inegável relevância dos pontos de vista jurídico e político, mormente quando se cogita desrespeito à competência privativa do Chefe do Poder Executivo. Aqui, o Projeto de Lei em questão tem a intenção de criar competições e campeonatos no município de Corumbá, envolvendo crianças e adolescentes, por meio da Secretaria Municipal de Educação e a Fundação de Esportes, sendo assim, possuindo o condão de acarretar despesa aos cofres municipais, destacando também a relevância econômica da questão debatida.

Primordialmente, necessário destacar a Lei Complementar nº 101/2000 (LRF) que estabelece normas acerca da responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição, a fim de garantir a responsabilidade fiscal dos entes federados, mediante normas de limites de gastos públicos; de vinculação do acesso a recursos públicos (transferências voluntárias e operações de crédito) à regularidade na aplicação das verbas federais anteriormente repassadas; e exigências de adequação orçamentária para criação de novos gastos, imprescindíveis para o alcance de uma correlação salutar entre novas despesas e suas respectivas compensações, com o intuito de evitar o aumento desordenado do gasto público ou renúncia de receita que possa trazer prejuízos a administração pública.

Consoante se depreende do art. 4º do presente PL, as despesas com execução do presente PL correrão por conta de dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário. Neste artigo verificamos a utilização de orçamento para destinação do Programa, entretanto, o Projeto de Lei não aponta o impacto financeiro e a fonte do recurso para implantação do programa.

Assim sendo, para o devido atendimento às determinações citadas no artigo 4º, o Projeto de Lei ora apresentado deveria constar a estimativa do impacto orçamentário-financeiro a ser causado pela implementação de tal medida.

Instada a se manifestar, a Fundação de Esportes de Corumbá acerca do PL em epígrafe, manifestou-se através do processo administrativo nº. 25848/2022 que, a proposta para LOA 2023 da FUNEC já foi finalizada, já tendo sido, inclusive, remetida para Secretaria Municipal de Finanças e Orçamento, e que o orçamento da fundação já se encontra totalmente comprometido para execução de atividades já programadas, não havendo possibilidade de se executar novos projetos no exercício corrente.

A Secretaria Municipal de Educação também se manifestou, onde por meio do processo administrativo nº. 25627/2022, relatou que já promove os jogos escolares da rede municipal de ensino, e que os jogos em comento além do cunho esportivo, possuem diretrizes pedagógicas.

Noutro giro, através do Projeto de Lei em comento, a Câmara cria obrigações à Administração. Embora meritório a preocupação do Legislativo local com as crianças e adolescentes (art. 1º do PL), a iniciativa não tem como prosperar na ordem constitucional vigente, uma vez que a norma diz respeito a atos inerentes à função do poder executivo.

Com efeito, a forma de prestação de serviços públicos é matéria de preponderante interesse do Poder Executivo, já que é a esse Poder que cabe a responsabilidade, perante a sociedade, pela eficiência da Administração.

Nos termos do parágrafo único do art. 2º, o Projeto de Lei cria obrigações a Secretaria Municipal de Educação e a Fundação de Esportes de Corumbá, na medida em que impõe a criação de campeonatos e competições, que inclusive, demandam orçamento para tanto.

Sendo assim, a iniciativa do processo legislativo para criação de políticas públicas, funcionamento de serviços municipais e atribuições às secretarias municipais é privativa do Poder Executivo, pois, como assinala Manoel Gonçalves Ferreira Filho “o aspecto fundamental da iniciativa reservada está em resguardar a seu titular a decisão de propor direito novo em matérias confiadas à sua especial atenção, ou de seu interesse preponderante” (Do Processo Legislativo, São Paulo, Saraiva, p. 204).

Por esse motivo, a Constituição Estadual, no inciso IX, do art. 89, conferiu ao Governador do Estado a iniciativa privativa das leis que disponham sobre as atribuições da administração pública e, consequentemente, sobre os serviços públicos por ela prestados, direta ou indiretamente. Trata-se de questão relativa ao processo legislativo, cujos princípios são de observância obrigatória pelos Municípios, em face do artigo 17, da Constituição do Estado, tal como tem decidido o Supremo Tribunal Federal:

“O modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Constituição da República - inclusive no que se refere às hipóteses de iniciativa do processo de formação das leis - impõe-se, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à incondicional observância dos Estados-Membros. Precedentes: RTJ 146/388 - RTJ 150/482” (ADIn nº 1434-0, medida liminar, relator Ministro Celso de Mello, DJU nº 227, p. 45684).

Se a regra é impositiva para os Estados-membros, é induvidoso que também o é para os Municípios.

As normas de fixação de competência para a iniciativa do processo legislativo derivam do princípio da separação dos poderes, que nada mais é que o mecanismo jurídico que serve à organização do Estado, definindo órgãos, estabelecendo competências e marcando as relações recíprocas entre esses mesmos órgãos (Manoel Gonçalves Ferreira Filho, op. cit., pp. 111-112). Se essas normas não são atendidas, como no caso em exame, fica patente a inconstitucionalidade, em face de vício de iniciativa.

Neste sentido, ensinou Hely Lopes Meirelles que se “a Câmara, desatendendo à privatividade do Executivo para esses projetos, votar e aprovar leis sobre tais matérias, caberá ao Prefeito vetá-las, por inconstitucionais. Sancionadas e promulgadas que sejam, nem por isso se nos afigura que convalesçam de vício inicial, porque o Executivo não pode renunciar prerrogativas institucionais inerentes às suas funções, como não pode delegá-las aquiescer em que o Legislativo as exerça” (Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 7ª ed., pp. 544-545).

Assim sendo, se a Constituição atribuiu ao Poder Executivo a responsabilidade pela prestação dos serviços públicos, é evidente que, pela teoria dos poderes implícitos, a ele deve caber a iniciativa das leis que tratem sobre a matéria. Essa teoria dos poderes implícitos - implied powers - surgiu no voto de Marshall, proferido no leading case McCulloch versus Maryland, de 1819, afirmando que, quando o Governo recebe poderes no sentido de cumprir certas finalidades estatais, dispõe também, implicitamente, dos meios necessários de execução. “Se o governante tem atribuições para praticar certos atos, cabe-lhe igualmente exercer aquelas que possibilitem seu exercício” (Caio Mário da Silva Pereira, em “Pareceres do Consultor-Geral da República”, v. 68, pp. 99-100).

III. DISPOSITIVO FINAL

Diante dos apontamentos acima alinhados, o Projeto de Lei não pode ser sancionado, vez que, em assim sendo, estar-se-á legislando sob a égide da ilegalidade, em razão de padecer de vício de inconstitucionalidade formal, razão pela qual apresento veto integral e total ao Projeto de Lei em questão, rogando aos Senhores Vereadores sua manutenção pelas razões ora expostas.

PREFEITURA MUNICIPAL DE CORUMBÁ,

EM 05 DE SETEMBRO DE 2022

MARCELO AGUILAR IUNES

PREFEITO DE CORUMBÁ