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M E N S A G E M Nº 65/2019

Excelentíssimo Senhor

Vereador ROBERTO GOMES FAÇANHA

Presidente da Câmara Municipal de Corumbá

Tenho a honra de dirigir-me a Vossa Excelência e, por seu intermédio, aos demais Excelentíssimos Senhores Vereadores para comunicar, na forma autorizada pelo art. 65, §1º da Lei Orgânica do Município, que optei pelo VETO TOTAL ao Projeto de Lei nº. 075/2019, o qual “Obriga as instituições bancárias públicas ou privadas e as cooperativas de crédito localizadas no Município de Corumbá, a contratar vigilância armada para atender 24 horas, por dia, inclusive em finais de semana e feriados, e dá outras providências”.

RAZÕES DO VETO

Trata-se a presente proposição que dispõe sobre a obrigação as instituições bancárias e cooperativas de crédito localizadas no Município de Corumbá-MS, a contratar vigilância armada para atender 24 horas, por dia, inclusive em finais de semana e feriados, e dá outras providências.

Sob o aspecto formal, infere-se que, ao dispor sobre a obrigação de as instituições bancárias e cooperativas de crédito localizadas no Município de Corumbá-MS, a contratar vigilância armada para atender 24 horas, por dia, inclusive em finais de semana e feriados, a proposta legislativa está a tratar de matéria de direito comercial e trabalhista, cuja competência para legislar é privativa da União, nos termos do art. 22, inciso I, da Constituição Federal, na medida em que impõe ao particular uma obrigação de natureza comercial e que tem reflexos nas obrigações trabalhistas.

Neste aspecto, ainda sob o aspecto formal, a proposta legislativa invade competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho (art. 22, I, CF), haja vista que impõe aos estabelecimentos supramencionados a contratação de funcionários para atuar nos finais de semana e aos sábados, gerando escalas de serviço em virtude da exigência ser 24hrs por dia, interferindo, dessa forma, na relação de trabalho entre empregador e empregado.

O princípio geral que norteia a repartição de competências entre os entes federados é a predominância do interesse, segundo o qual cabem à União as questões de interesse geral; aos Estados, caracterizado por circunstâncias demográficas, econômicas, administrativas e geográficas que justifiquem o uso desta competência; e aos Municípios, as matérias de interesse local.

Com efeito, a medida imposta não apresenta nenhuma peculiaridade local que justifique a edição de norma municipal. Ao contrário, o dever imposto pela proposta apresenta indiscutível caráter geral, o que demanda disciplina uniforme em todo o território nacional, inclusive, por tratar de segurança privada e não pública.

Vejamos entendimento jurisprudencial:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL N. 5.964/2018. DISPÕE SOBRE A OBRIGATORIEDADE DA CONTRATAÇÃO DO SERVIÇO DE VIGILÂNCIA PROFISSIONAL ARMADA PELAS CASAS LOTÉRICAS, CORRESPONDENTES BANCÁRIOS E ASSEMELHADOS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. INOBSERVÃNCIA DE VÍCIOS FORMAIS ORGÃNICOS E DE INICIATIVA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LIVRE INICIATIVA, DA LIVRE CONCORRÊNCIA, DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE.

O STF resolveu relevante questão sobre o campo de incidência da norma em controle abstrato de inconstitucionalidade, no julgamento da ADI 4861. O Pleno assentou o entendimento de que, para aferir a qual catálogo de competências recai uma questão específica e, portanto, determinar quem tem a prerrogativa para legislar sobre determinado assunto, deve ser realizada interpretação que leve em consideração a posição da situação fática normatizada com a estrutura básica descrita no tipo da competência em análise e o fim primário a que se destina essa norma, que possui direta relação com o princípio da predominância de interesses.

Trata-se, portanto, de norma que tem reflexos precipuamente na proteção do consumidor, matéria inserida no âmbito de competência concorrente entre a União, os estados e o Distrito Federal, a teor do que dispõe o art. 24, inciso V, da Constituição Federal (produção e consumo), e revela interesse local.

A norma, entretanto, padece de vícios materiais, que violam excessivamente a livre iniciativa e a livre concorrência.

O texto da norma impugnada exige a contratação de vigilância armada. Não se trata da contratação de serviços de vigilância privada, mas de serviços de vigilância privada altamente especializados, qualificados e de alto custo, porque há obrigação de que os profissionais de vigilância admitidos estejam armados.

O fato de a norma demandar a contratação de vigilância armada por todas as entidades que menciona, de forma generalizada, traduz-se em reserva de mercado prejudicial à livre iniciativa e à livre concorrência.

Ressalte-se que há diferença entre as remunerações de cada empresa, a depender do tipo de serviço prestado. Dessa forma, a imposição legal de encargos de segurança de maneira uniforme a todos os empreendimentos relacionados na lei distrital onera de forma desigual e injusta aquelas atividades mais simples. A situação do Distrito Federal agrava-se pela sua posição geográfica, diante da proximidade com diversos municípios dos estados de Goiás e de Minas Gerais que formam a região do entorno e que não contam com disposições normativas semelhantes.

Referida lei também promove a indevida terceirização da segurança pública, com violação aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, restringindo a necessidade de vigilância armada a um núcleo particularizado do mercado de serviços, quando outros setores relevantes, que também atuam com significativas somas em dinheiro, tais como o transporte coletivo de passageiros e postos de gasolina, passam por problemas semelhantes que impactam a segurança da população em geral, mas que não suportam as mesmas responsabilidades.

O caos na segurança pública, certamente, não pode ser imputado unicamente às casas lotéricas, cooperativas de crédito, correspondentes bancários, agências dos Correios e assemelhados em funcionamento no Distrito Federal, também não podendo ser atribuída a essas entidades a responsabilidade principal pelo restabelecimento da segurança pública. Sob esse aspecto, a norma impugnada não é capaz de garantir uma existência digna para as pessoas, sob o imperativo da justiça social.

Ação direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei Distrital n. 5.964/2017, com efeitos ex tunc e eficácia erga omnes.

(Acórdão 1172169, 20170020202140ADI, Relator: JOÃO TIMÓTEO DE OLIVEIRA, CONSELHO ESPECIAL, data de julgamento: 14/5/2019, publicado no DJE: 24/5/2019. Pág.: 1937/1938)

Ademais, por outro giro, ainda que o assunto tratado no presente Projeto de Lei fosse da competência do Município, a proposta legislativa estaria a intervir em ato típico da Administração, uma vez que, indiretamente, impõe a esta obrigações inerentes à fiscalização do cumprimento da norma (embora não aponte o órgão que fará a fiscalização), o que interfere nas atribuições do Chefe do Executivo, a quem compete dispor privativamente sobre a estruturação e atribuições dos órgãos e serviços da Administração Pública (execução dos serviços públicos e políticas públicas).

Invocando o princípio da simetria, e, com efeito, de acordo com o teor dos arts. 67, § 1º, inciso II, alíneas “a” e “d”, e 89, incisos V e IX, da Constituição Estadual, é da competência do Chefe do Executivo a iniciativa das leis que impliquem na organização dos serviços públicos, especialmente no que se refere à fiscalização do cumprimento da norma por particulares.

Nesse contexto, a disposição contida no art. 5° do Projeto, que determina ao Poder Executivo o dever de regulamentar também deve ser tida por inconstitucional, porque o Executivo não pode ser compelido pelo Legislativo a exercer o seu poder regulamentar, por força do próprio texto constitucional (art. 89, VII, CE), sob pena de ofensa ao princípio da harmonia e da separação dos poderes (art. 2º, caput, CE).

Não bastassem as inconstitucionalidades de natureza formal, a proposta legislativa também deve ser vetada por razões de natureza material.

A Constituição da República, em seu art. 170, incisos II e III, atribuiu à propriedade privada e à função social da propriedade a condição de direito fundamental e princípio geral da Ordem Econômica, assim, as normas afetas à propriedade privada e a sua função social devem ser promovidas de forma que não aniquilem a livre iniciativa e o livre exercício da atividade econômica, também princípios basilares da Ordem Econômica (art. 170, caput e parágrafo único, CF).

Mister salientar que, não é permitido ao legislador intervir na organização interna da empresa privada, como pretende a presente proposta, sob pena de ferir o direito de propriedade privada, desvirtuando a sua função social, bem como contrariar os princípios da livre iniciativa e do livre exercício da atividade econômica (art. 170, caput, II e III e a parágrafo único, CF).

Aqui ainda cabe estabelecer que a Constituição Federal é muito clara ao definir a participação tão somente do Estado na atividade econômica, limitando-se à fiscalização, ao incentivo e ao planejamento, sendo este determinante para o setor público e apenas indicativo para o privado (art. 174, CF).

A presente proposta impõe aos estabelecimentos particulares o dever de contratar funcionários, ocasionando evidente violação aos princípios da livre iniciativa e do livre exercício da atividade econômica, o que enseja o reconhecimento da inconstitucionalidade material da proposta.

Pelo exposto, conclui-se pela inconstitucionalidade da proposição, optando-se assim pelo veto total ao Projeto de Lei nº. 075/2019, pelo qual “Obriga as instituições bancárias públicas ou privadas e as cooperativas de crédito localizadas no Município de Corumbá, a contratar vigilância armada para atender 24 horas, por dia, inclusive em finais de semana e feriados, e dá outras providências”.

PREFEITURA MUNICIPAL DE CORUMBÁ,

EM 27 DE NOVEMBRO DE 2019               

MARCELO AGUILAR IUNES

PREFEITO MUNICIPAL