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MENSAGEM Nº 40/2015

Corumbá, 29 de setembro de 2015.

Senhor Presidente,

Com os meus cumprimentos, comunico a essa augusta Câmara Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que, autorizado pelo § 1º do art. 65 da Lei Orgânica do Município de Corumbá, decidi impor VETO TOTAL ao projeto de lei nº 53/2015, que “Dispõe sobre a obrigatoriedade da publicação, no site oficial da Prefeitura e em todas as unidades básicas de saúde, da relação de medicamentos existentes, daqueles em falta e o local onde encontrá-los na rede Municipal de Saúde, e dá outras providências”, pelas razões que, respeitosamente, passo a expor:

RAZÕES DO VETO:

Pretende o Poder Legislativo disciplinar a publicação da relação de medicamentos existentes e daqueles em falta no site oficial da Prefeitura e em todas as unidades de Saúde do Município.

Conquanto seja louvável a proposição do ilustre legislador, a proposição padece de vício de iniciativa, uma vez que trata da implantação de atribuição a ser executada por órgãos do Poder Executivo, infringindo assim, o inciso III do art. 62 da Lei Orgânica do Município - LOM, que prescreve que: São de iniciativa exclusiva do Prefeito as leis que disponham sobre criação, estruturação e atribuições das Secretarias, Departamentos ou Diretorias equivalentes e órgãos de Administração Pública, restando caracterizada a criação de nova modalidade de serviço público, incumbência essa privativa do Prefeito Municipal.

Sendo desrespeitada a titularidade para a apresentação da proposta legislativa, ocorrerá a usurpação de iniciativa, o que acarreta inconstitucionalidade por desobediência ao princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal.

A Sua Excelência o Senhor

JOSÉ TADEU VIEIRA PEREIRA

Presidente da Câmara Municipal

CORUMBÁ - MS

A Lei Orgânica do Município, por simetria, reproduziu esse regramento, no que era cabível. Destarte, a eventual ofensa a este princípio pelo Poder Legislativo inquina o ato normativo de nulidade, por vício de inconstitucionalidade formal.

Transcrevemos o posicionamento recente do Supremo Tribunal Federal, verbis:

EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. CRIAÇÃO DE ATRIBUIÇÃO PARA ÓRGÃO DO PODER EXECUTIVO. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. VÍCIO RECONHECIDO NA ORIGEM. CONSONÂNCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TRÂNSITO. SÚMULA 280/STF. PROCEDIMENTO VEDADO NA INSTÂNCIA EXTRAORDINÁRIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 1º.10.2013. O entendimento adotado pela Corte de origem, nos moldes do que assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal. Na esteira da jurisprudência desta Corte, padece de inconstitucionalidade formal lei de iniciativa parlamentar que disponha sobre atribuições de órgãos da Administração Pública. Entender de modo diverso demandaria análise da legislação infraconstitucional local apontada no apelo extremo, o que torna oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, portanto, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. Agravo regimental conhecido e não provido.
(ARE 826671 AgR, Relator(a):  Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 25/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-241 DIVULG 09-12-2014 PUBLIC 10-12-2014)

Acerca do tema central do projeto de lei sob veto há jurisprudência de tribunal pátrio, vejamos:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE ESTEIO. LEI MUNICIPAL N.º 2.976/1999. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. LEI DE INICIATIVA LEGISLATIVA DISPONDO SOBRE OBRIGAÇÃO DO EXECUTIVO MUNICIPAL RELACIONAR E PUBLICAR LISTA DOS MEDICAMENTOS ADQUIRIDOS PARA DISTRIBUIÇÃO. INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 8º, 10, 60, II, ALÍNEA "D" E 82, VII, TODOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. 1) - Padece de vício de iniciativa, lei que determina condutas administrativas próprias da organização do Executivo dispondo sobre as atribuições das Secretarias Municipais e dos demais órgãos da Administração Pública municipal. 2) - Padece de vício formal e material a Lei Municipal n.º 2.976/1999, de iniciativa Legislativa que dispõe sobre o dever do Legislativo relacionar, mensalmente, todos os medicamentos adquiridos para distribuição gratuita às famílias carentes e o dever de publicação e de afixação da relação no Hospital São Camilo, na Secretaria Municipal da Saúde, Meio Ambiente e Ação Social, nos Postos de Saúde e na Câmara de Vereadores daquele Município, porquanto compete privativamente ao chefe do Poder Executivo. AÇÃO PROCEDENTE. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70013110796, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Wellington Pacheco Barros, Julgado em 25/09/2006)”

Oportuno registrar ainda que o vício é insanável porque as leis com vício de iniciativa não podem ser convalidadas pelo Chefe do Poder Executivo. O Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou no sentido de que não é possível suprir o vício de iniciativa com a sanção. Senão vejamos:

“O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo de positivação do Direito, gerado pela usurpação de poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado. STF, Pleno, Adin n.º. 1.391-2/SP, Rel. Ministro Celso de Mello, Diário de Justiça, Seção I, 28 nov.”.

Sobre a impossibilidade da sanção do Chefe do Poder Executivo sanar o vício de iniciativa legislativa, Alexandre de Moraes em sua obra Direito Constitucional, em sua 12ª ed., São Paulo, Atlas esclarece:

“Assim, supondo que um projeto de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo tenha sido apresentado por um parlamentar, discutido e aprovado pelo Congresso Nacional, quando remetido à deliberação executiva, a eventual aquiescência do Presidente da República, por meio da sanção, estaria suprindo o inicial vício formal de constitucionalidade? Acreditamos não ser possível suprir o vício de iniciativa com a sanção, pois tal vício macula de nulidade toda a formação da lei, não podendo ser convalidado pela futura sanção presidencial. A Súmula 5 do Supremo Tribunal Federal, que previa posicionamento diverso, foi abandonada em 1974, no julgamento da Representação n.º 890 – GB, permanecendo, atualmente, a posição do Supremo Tribunal Federal pela impossibilidade de convalidação, (...).”

O projeto de lei sob análise cria uma atribuição obrigatória à órgão do Poder Executivo.

Ronaldo Polleti bem apanha esta questão, quando enfatiza que "um dos pontos cardeais de uma Constituição Federal reside na repartição da competência legislativa entre os entes componentes do Estado. A par, todavia, daquela partilha entre os Estados-Membros, União e Municípios, da matéria legislativa, cujo descumprimento gera a inconstitucionalidade, há, hoje, por outro lado, um alargamento da participação do Executivo no processo legislativo, de maneira a concluir-se pela repartição legislativa também em termos horizontais" ('Controle da Constitucionalidade das Leis', Forense, 1985, pág. 168).

Neste particular, o projeto de lei em comento é manifestamente inconstitucional, por agredir a Constituição Federal e a Lei Orgânica do Município (LOM), uma vez que, dispõe sobre atribuição de Órgãos Do Poder Executivo.

De outro norte, A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) se manifestou informando que, apesar da relevância do projeto de lei, a SMS já disponibiliza a relação de documentos, bem como, há a Ouvidoria do SUS, que é mecanismo para recebimento de todas as denúncias relacionadas ao Serviços de Saúde, na qual as demandas são registradas e respondidas aos Usuários do SUS.

Portanto, considerando que o projeto de lei nº 53/2015 conflita com o ordenamento jurídico e atenta contra o interesse público, alternativa não me resta a não ser impor o presente veto total, contando com a compreensão e aquiescência dos nobres senhores Vereadores, para que o mesmo seja mantido.

Atenciosamente,

PAULO DUARTE

Prefeito Municipal