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MENSAGEM Nº 74/2013

Corumbá, 10 de dezembro de 2013.

Senhor Presidente,

Com os meus cumprimentos, comunico a essa augusta Câmara Legislativa, por intermédio de Vossa Excelência, que, autorizado pelo § 1º do art. 65 da Lei Orgânica do Município de Corumbá, decidi impor VETO TOTAL ao projeto de lei nº 103/2013, que “Dispõe sobre a obrigatoriedade da divulgação do cardápio da merenda escolar pelo Executivo Municipal por meio da Secretaria Municipal de Educação, e dá outras providências”, pelas razões que, respeitosamente, passo a expor:

RAZÕES DO VETO:

Pretendeu o ilustre membro do Poder Legislativo de Corumbá obrigar, o Poder Executivo Municipal por meio da Secretaria Municipal de Educação, publicar o cardápio da merenda escolar com no mínimo trinta dias de antecedência do seu fornecimento.

Primeiramente, no tocante a iniciativa, a matéria padece de vício formal insanável por afronta ao disposto no inciso III do art. 62 da Lei Orgânica do Município (LOM), que atribui privativamente ao Prefeito a iniciativa de leis que criem atribuições para secretarias municipais, uma vez que o projeto confere atribuições à Secretaria Municipais de Educação.

Nesse sentido, o referido dispositivo da Lei Orgânica do Município de Corumbá dispõe que, somente o Chefe do Poder Executivo é competente para legislar matérias que disponham sobre atribuições à órgãos Municipais, senão vejamos:

A Sua Excelência o Senhor

MARCELO AGUILAR IUNES

Presidente da Câmara Municipal

CORUMBÁ - MS

“Art. 62 São de iniciativa exclusiva do Prefeito as leis que disponham sobre:

III – criação, estruturação e atribuições das Secretaria, Departamentos ou Diretorias equivalentes e órgãos de Administração Pública;” (grifo nosso)

Com efeito, o inciso III do art. 62 da Lei Orgânica traça as competências próprias de administração e gestão – ou seja, competência privativa – e cunha a denominada reserva de Administração, pois, veicula matérias de sua alçada exclusiva, imunes à interferência do Poder Legislativo, como o exercício, com auxílio dos Secretários, nos limites da competência do Poder Executivo.

Sendo desrespeitada a titularidade para a apresentação da proposta legislativa, ocorre a usurpação de iniciativa, o que acarreta inconstitucionalidade por desobediência ao princípio da separação do poder, inserto no art. 2º da Constituição Federal.

Oportuno registrar ainda que o vício é insanável porque as leis com vício de iniciativa não podem ser convalidadas pelo Prefeito, consoante preconizava jurisprudência do STF, observa-se:

“O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo de positivação do Direito, gerado pela usurpação de poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado - STF, Pleno, Adin n.º. 1.391-2/SP, Rel. Ministro Celso de Mello, Diário de Justiça, Seção I, 28 nov. 1997, p. 62.216, apud Alexandre DE MORAES, Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional , São Paulo, Atlas, 2002, p. 1.098.

Ademais, o art. 2º da Carta Magna da República taxativamente dispõe que são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Dessa norma constitucional se abstrai que não pode o Poder Legislativo interferir na competência privativa do Chefe do Poder Executivo, em razão da independência. Aliás, visando a preservar a necessária harmonia das relações institucionais, nenhum Poder pode se imiscuir na competência privativa de outro.

É pacífico na jurisprudência o entendimento sobre a inconstitucionalidade formal na criação da lei, no que se refere à cláusula de reserva de iniciativa do processo legislativo. Vejamos o seguinte julgado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DO MUNICÍPIO DE VIAMÃO. INSTITUIÇÃO DE PROGRAMA DE HIGIENE BUCAL NA REDE DE ENSINO MUNICIPAL. INICIATIVA DA CÂMARA DE VEREADORES. VÍCIO FORMAL. MATÉRIA RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA SIMETRIA E DA HARMONIA E INDEPENDÊNCIA ENTRE OS PODERES. Deve ser declarada inconstitucional a Lei Municipal n.º 3.893, de 16 de agosto de 2011, de iniciativa da Câmara de Vereadores, a instituir programa de higiene bucal na rede de ensino, pois impõe atribuições à Secretaria Municipal da Educação e interfere na organização e funcionamento da Administração, matéria de iniciativa do Chefe do Poder Executivo. (TJ-RS - ADI: 70044693992 RS , Relator: Orlando Heemann Júnior, Data de Julgamento: 19/12/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 16/01/2012)” (grifo nosso)

“O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de poderes, desconstituir, por lei, atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação ultra vires do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais” (STF, ADI-MC 2.364-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-08-2001, DJ 14-12-2001, p. 23).

O exercício do poder do chefe do Poder Executivo situa-se dentro da principiologia constitucional da separação dos Poderes, na forma consagrada no já citado art. 2º e elencada como cláusula pétrea pelo inciso III do § 4º do art. 60 da Constituição Federal.

Neste particular, o projeto de lei em comento é manifestamente inconstitucional, por agredir a Constituição Federal e a Lei Orgânica do Município (LOM), uma vez que, dispõe sobre criação, estruturação e atribuição à Órgãos da Administração Pública.

Ademais, a obrigatoriedade de publicação do cardápio da merenda escolar com trinta dias de antecedência do seu fornecimento, a ser executada por órgão do Poder Executivo, enquadra-se como mais um serviço público à disposição da população, trazendo dispêndio financeiro sem planejamento ao Município.

Nesse sentido, prescreve o caput do art. 15 da Lei Complementar Federal nº 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF), que serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

A LRF, em seu art. 16 prescreve que a medida que acarrete aumento de despesa será acompanhada de: (I) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; e (II) declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

Por seu turno, o art. 17 da mesma lei complementar dispõe que o ato que crie ou aumente despesa obrigatória de caráter continuado, além de ser instruído com a estimativa de que trata o inciso I do art. 16, deverá demonstrar a origem dos recursos para seu custeio, bem como comprovar que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO. Vejamos o que diz a jurisprudência sobre o tema:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – ATO NORMATIVO MUNICIPAL DE INICIATIVA DE VEREADOR E QUE DISCIPLINA A RESPONSABILIDADE E GUARDA DE ANIMAIS, CRIANDO OBRIGAÇÕES PARA A ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, SEM A PREVISÃO, AINDA, DAS FONTES DE CUSTEIO DOS NOVOS SERVIÇOS — V Í C IO DE INICIATIVA — MATÉRIA INSERIDA NA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO CHEFE DO EXECUTIVO - VIOLAÇÃO DA CLÁUSULA DE SEPARAÇÃO DOS PODERES - OFENSA AOS ARTIGOS 2a , 5a, 25 E 47. II, TODOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, APLICÁVEIS AOS MUNICÍPIOS EX VI O ARTIGO 1 4 4 DA MESMA CARTA – INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA-AÇÃO PROCEDENTE. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE NB 994.09.231054-1 — VOTO N 2 18099. COMARCA: SÃO PAULO (LEI MUNICIPAL NB 7283/2009 DE FRANCA). REQUERENTE: PREFEITO DO MUNICÍPIO DE FRANCA. REQUERIDO: PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE FRANCA. NATUREZA DA AÇÃO: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI.

Depreende-se da análise do projeto de lei, que não houve, em nenhum dos dispositivos, a previsão de estimativa de impacto orçamentário-financeiro da implantação do CEBEA, nem a declaração do ordenador de despesa quanto à adequação da despesa com a lei orçamentária anual. Tampouco consta qualquer demonstrativo da origem dos recursos para o custeio da despesa do Município com a realização dessa atividade.

Pelo fato de o projeto não guardar correspondência com a Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que a criação dessa obrigatoriedade está condicionada à obediência dos requisitos expostos na legislação infraconstitucional, o que não ocorreu no caso em tela, também por este motivo, não pode tal proposição receber a sanção do Chefe do Poder Executivo.

Por fim, convém informar que a questão da merenda escolar trata-se de matéria disciplinada na RESOLUÇÃO/CD/FNDE nº 26, de 17 de junho de 2013, portanto, tem as diretrizes fixadas em todo o território nacional.

Desta feita, tem contemplado no §8º do inciso VI do art. 14 da Resolução nº26/2013, o conteúdo abordado na pretensão legislativa, qual seja, a publicação do cardápio de merenda escolar.

Conforme informações da Secretaria Municipal de Educação, todos os cardápios são amplamente divulgados nas escolas da Rede Municipal de Educação e apresentados à comunidade escolar em reuniões programadas ao longo do ano letivo, Outrossim, os cardápios, após serem apresentados à comunidade local, são disponibilizados em local visível e de fácil acesso a todos.

Assim, entendemos que o conteúdo do Projeto de Lei, não merece prosperar eis que a Secretaria Municipal de Educação por intermédio do Programa Municipal de Alimentação Escolar já executa com propriedade e zelo, o Programa em cumprimento das diretrizes Federais e assim o faz submetendo o cardápio à apreciação do CAE, colegiado que possui legitimidade e competência para tal.

Portanto, considerando que o projeto de lei sob análise conflita com o ordenamento jurídico pátrio, notadamente no que se refere à iniciativa do processo legislativo, a Lei de Responsabilidade Fiscal e atenta contra o interesse público, alternativa não me resta a não ser impor o presente veto total, contando com a compreensão e aquiescência dos nobres senhores Vereadores, para que o mesmo seja mantido.

Atenciosamente,

PAULO DUARTE

Prefeito Municipal